O sistema respiratório representa um papel essencial no nosso corpo, como todos sabemos. A sua função vai determinar uma data de fatores ao longo da nossa vida.
O objetivo deste artigo será elucidar o leitor para a complexidade da atividade do aparelho respiratório, as principais alterações dos padrões respiratórios e a importância em otimizar a sua funcionalidade.
Já imaginaram se andássemos nos nossos carros com os pneus vazios? Ou extremamente cheios? Ou até cheios em apenas um lado e do outro vazio?
Tratamos melhor os nossos carros do que o nosso corpo, ignoramos completamente os alertas quando algo está mal… Sim tal como os nossos veículos, nós também temos sensores reguladores de pressão. Se a pressão é muito alta ou baixa o corpo avisa e dá sinais.
1.Diafragma e pavimento pélvico
A relação entre o pavimento pélvico e o diafragma é fundamental para a nossa locomoção, suporte pélvico, continência, aparelho digestivo e função sexual, bem como na estabilização da postura corporal, pois participam em conjunto com os músculos posturais.
Estes associam-se a partes distantes do nosso corpo, literalmente da cabeça aos pés, por meio de conexões miofasciais. Devido a esta continuidade tecidual, os distúrbios funcionais do diafragma ou pavimento pélvico, podem resultar em disfunções de músculos, ligamentos e fáscias, em qualquer segmento do corpo.(1)
Ao inspirar, o diafragma contrai, fica mais achatado e move-se caudalmente, aumentando assim o espaço na caixa torácica. Durante a expiração, o diafragma relaxa, torna-se cefálico, e os músculos da parede abdominal anterior contraem. A pressão intra-abdominal ideal é mantida por essas tensões cíclicas e movimentos musculares em direcções específicas.(2)
2.Respiração Nasal e Bucal
A respiração nasal é inata ao ser humano devido à sua importante função de preparar o ar para alcançar estruturas importantes do sistema respiratório. O nariz fornece uma resistência à respiração que representa o dobro comparativamente a respirarmos de boca aberta. Este aumento da resistência à inspiração e expiração traz uma série de benefícios fisiológicos, entre eles o aumento do volume pulmonar total (3). Além disso, é essencial para o desenvolvimento e funcionalidade dos sistemas craniofacial e estomatognático (4).
A respiração bucal resulta num maior recrutamento da musculatura acessória durante a inspiração e menor amplitude do movimento diafragmático em relação à respiração nasal.(7)
3.Tipos de disfunções do padrão respiratório e sintomas
Existem diversos padrões, o mais comum é a hiperventilação, que é definida como respirar além das necessidades metabólicas, reduzindo as concentrações de dióxido de carbono (hipocápnia) no sangue abaixo do normal.
Isso altera o PH do corpo, aumentando a alcalinidade e, assim, desencadeando uma variedade de mudanças adaptativas que produzem os seguintes efeitos:
Efeitos psicológicos: Cansaço, perturbações sensoriais (sensibilidade à luz e ao som), tonturas, ansiedade, stress, corpo vive em estado de alerta (resposta de luta ou fuga).
Efeitos físicos: Exaustão, formigueiro, cãibras, fraqueza, irregularidades do ritmo cardíaco.
Conhece alguém que até quando está parado não consegue parar de mexer ou abanar a perna de forma repetitiva e involuntária? Provavelmente vive num estado de hiperventilação.
A Hipoventilação ocorre quando a respiração é muito superficial e inadequada para realizar as trocas gasosas necessárias, levando ao aumento das concentrações de CO2 (hipercapnia) e acidose respiratória ou metabólica.
Frequentemente associado à obesidade mórbida, ou outras patologias, como diabetes, doenças respiratórias crónicas. Podemos identificar outros sinais de hipercapnia:
Cefaleia, frequentes despertares noturnos associados a taquicardia e sufocação, sonolência diurna excessiva, dificuldades de concentração, perda de peso e apetite.
A Hipóxia caracteriza-se pelo reduzido aporte de oxigénio (O2) aos tecidos, abaixo dos níveis fisiológicos para a adequada perfusão sanguínea dos tecidos. O extremo da hipóxia é a anóxia, ambos são quadros clínicos importantes e urgentes.(6)
4.Alterações biomecânicas
Recordando a analogia do nosso corpo e os carros, se continuamos a ignorar os avisos dos nossos sensores, quais serão as repercussões na mecânica do nosso corpo?
Uma função respiratória alterada, seja em que idade for, conduz a problemas relacionados com “má postura”, ritmo escapulo torácico alterado, lombalgia, cervicalgia, dor na articulação temporomandibular, queixas álgicas ombros, ancas, entre outros. (8)
Logicamente não podemos apontar ao nosso aparelho respiratório, como a única causa de todas destas alterações estruturais ou nas diferentes patologias do sistema músculo-esquelético, mas é importante destacar que se o nosso esqueleto axial não é dinâmico e funcional, outras estruturas terão de se adaptar para compensar essas limitações.
Rigidez da caixa torácica
Durante a hiper-insuflação, as costelas mudam da sua posição oblíqua normal para uma posição mais horizontal, prejudicando a ação inspiratória dos músculos da caixa torácica e tornando a caixa torácica rígida e difícil de expandir. As restrições da caixa torácica inibem ainda mais a função do diafragma.(15)
Disfunções da parte superior do corpo
No caso de aumento da demanda ventilatória quando a respiração é ineficiente, os músculos respiratórios da caixa torácica superior, como escalenos, esternomastóideo, trapézio superior e outros músculos anteriores do pescoço, como o hioide e o longo do pescoço, aumentam sua atividade.(9)(10)(11)
Isso resulta em aumento do movimento vertical da caixa torácica e elevação dos ombros durante a fase inspiratória da respiração.
Consequente surge a tendência em projetar a cabeça para a frente como resposta à dificuldade respiratória, porque essa posição da cabeça abre as vias aéreas superiores.
Essa postura da cabeça anteriorizada, embora facilite a respiração, tem vários efeitos adversos na biomecânica da cabeça, pescoço e mandíbula e está associada a problemas na articulação temporo mandibular, dor no pescoço e cefaleias.(9)
Problemas no ombro também podem ocorrer porque os músculos hipertônicos alteram a dinâmica do movimento. Esse padrão alterado de movimento escapulo-umeral está também associado a patologias no ombro e disfunção do manguito rotador. (10)
Respiração no controlo postural e motor
Músculos como o diafragma, transverso abdominal e músculos do assoalho pélvico são importantes para o controlo motor e suporte postural, bem como para a respiração. Se a sua função estiver comprometida, há maior suscetibilidade de ter dores nas costas e lesões.(12)(13) Curiosamente, a presença de doença respiratória é um preditor mais forte de dor lombar do que outros fatores de risco estabelecidos.(14)(15)
5.Conclusão
Existem inúmeras evidências de mudanças objetivas positivas, no estado emocional, na postura e estabilidade, diminuição da tensão muscular, mobilidade e aumento da performance desportiva.
Apesar do enorme potencial na reabilitação, ainda surge como uma área pouco aplicada em contexto clínico.
Após a leitura deste artigo questionamos-lhe:
Como está a sua pressão hoje?
… Ou melhor, Como se sente?
Um abraço da sua equipa multidisciplinar
– Artigo escrito pelo Fisioterapeuta Jaime Sousa
Bibliografia
1- Bordoni, B.; Zanier, E. Anatomic Connections of the Diaphragm: Influence of Respiration on the Body System. J. Multidiscip. Healthc. 2013, 6, 281–291
2- Bordoni, B.; Sugumar, K.; Leslie, S.W. Anatomy, Abdomen and Pelvis, Pelvic Floor. In StatPearls; StatPearls Publishing: Treasure Island, FL, USA, 2020;
3- Suzuki M, Tanuma T. The effect of nasal and oral breathing on airway collapsibility in patients with obstructive sleep apnea: Computational fluid dynamics analyses. PLoS One. 2020 Apr 13;15(4):e0231262. doi: 10.1371/journal.pone.0231262. PMID: 32282859; PMCID: PMC7153879.
4- S. Armijo-Olivo et al. The association between the cervical spine, the stomatognathic system, and craniofacial pain: a critical review J Orofac Pain(2006).
5- Jim Bartley, Chapter 2.3 – Nasal influences on breathing, Editor(s): Leon Chaitow, Dinah Bradley, Christopher Gilbert,Recognizing and Treating Breathing Disorders (Second Edition),Churchill Livingstone, 2014,Pages 45-50,ISBN 9780702049804.
6- Leon Chaitow, Dinah Bradley, Chris Gilbert,Recognizing and Treating Breathing Disorders (Second Edition), Churchill Livingstone, 2014, ISBN 9780702049804.
7- Trevisan ME, Boufleur J, Soares JC, Haygert CJ, Ries LG, Corrêa EC. Diaphragmatic amplitude and accessory inspiratory muscle activity in nasal and mouth-breathing adults: a cross-sectional study. J Electromyogr Kinesiol. 2015 Jun;25(3):463-8. doi: 10.1016/j.jelekin.2015.03.006. Epub 2015 Apr 6. PMID: 25900327.
8-Courtney, Rosalba. (2009). The functions of breathing and its dysfunctions and their relationship to breathing therapy. International Journal of Osteopathic Medicine – INT J OSTEOPATH MED. 12. 10.1016/j.ijosm.2009.04.002.
9- Hruska R. Influences of dysfunctional respiratory mechanics on orofacial pain. Dent Clin North Am 1997;41:211–27.
10- Pryor JA, Prasad SA. Physiotherapy for respiratory and cardiac problems. 3rd ed. Edinburg: Churchill Livingstone; 2002.
11- De Troyer A, Estenne M. Coordination between rib cage muscles and diaphragm during quiet breathing in humans. J Appl Physiol 1984;57:899–906.
12- Hungerford B, Gilleard W, Hodges P. Evidence of altered lumbopelvic muscle recruitment in the presence of sacroiliac joint pain. Spine 2003;28:1593–600.
13- Csepregi É, Gyurcsik Z, Veres-Balajti I, Nagy AC, Szekanecz Z, Szántó S. Effects of Classical Breathing Exercises on Posture, Spinal and Chest Mobility among Female University Students Compared to Currently Popular Training Programs. Int J Environ Res Public Health. 2022 Mar 21;19(6):3728. doi: 10.3390/ijerph19063728. PMID: 35329415; PMCID: PMC8950379.
14- Smith MD, Russell A, Hodges PW. Disorders of breathing and continence have a stronger association with back pain than obesity and physical activity. Aust J Physiother 2006;52:11–6.
15- Effects of Lower Rib Expansion Limitation on Maximal Respiratory Pressure and Abdominal Muscle Activity During Maximal Breathing in Healthy SubjectsJ Kor Phys Ther 2020;32(6):394-399Published online December 30, 2020; https://doi.org/10.18857/jkpt.2020.32.6.394© 2020 The Korea Society of Physical Therapy.