Microbiota Vaginal: Já ouviu falar? Se a resposta é não, hoje é o dia!

Podemos também dizer “o pipi e os seus bichinhos” porque, na realidade, habitam em nós, seres humanos, uma variedade imensa de microrganismos – células e bactérias – em todo o nosso corpo, dentro e fora dele; no aparelho reprodutor feminino não é diferente, e é disso que falamos quando nos referimos à microbiota vaginal, que é, portanto, um conjunto de microrganismos que vive de forma natural na vagina, cuja função é desempenhar uma barreira defensiva contra as células menos benéficas.

O muco vaginal (vulgarmente chamado de corrimento) é composto entre 90 – 95% por água, e o resto por vitaminas, ácido lático, proteínas, glicose, enzimas, ferro… e são estes nutrientes do muco vaginal que facilitam a colonização ou a vida de algumas bactérias que constituem e que permitem o equilíbrio deste “ecossistema”. Mas este ecossistema é muito sensível, e nele, podem habitar fungos ou bactérias pouco saudáveis que destroem este equilíbrio na vida do nosso pipi. Muitos fungos podem existir na microbiota vaginal sem se manifestar durante algum tempo, sobretudo se se mantiverem em quantidades baixas, porque uma vez que se manifestam através de uma infeção vaginal (como é exemplo a candidíase) ou de uma vaginose bacteriana, considera-se que há um desequilíbrio desta microbiota vaginal, dando origem a uma disbiose – um desvio da normalidade.

A microbiota vaginal normal é diferente em cada etapa da vida e depende fortemente da ação de dois sistemas:

Hormonal: os estrogénios. Depois da primeira menstruação e durante toda a fase fértil, o ciclo menstrual é regulado por uma série de hormonas mas, para simplificar vou apenar referir duas: os estrogénios e a progesterona. Quando uma aumenta a sua concentração, a outra tem de baixar. Se isto não acontece, começam a surgir queixas associadas ao ciclo menstrual: ou é curto, ou é longo, ou sentes dor, ou tens coágulos, ou ficas muito inchada, e tudo integra o painel de sintomas pré-menstruais que dependendo das queixas e da intensidade das mesmas, te fazem querer solucionar a questão o mais rápido possível, porque sentes que não estás em equilíbrio. O problema é que as respostas oferecidas, habitualmente resolvem o sintoma, mas não resolvem a raíz ou a causa do problema. É sabido que tanto os estrogénios como a progesterona têm efeito no intestino e no cérebro, motivo pela qual, de acordo com algumas fases do ciclo menstrual, a consistência das fezes altera – a título de exemplo: a progesterona diminui o peristaltismo ou a atividade intestinal, e os estrogénios, quando em concentração elevada, afetam negativamente o intestino, onde se localiza cerca de 80% da nossa função imunitária.

Intestinal: a microbiota intestinal – as bactérias do intestino – comunicam diretamente com as bactérias da vagina e da pele. Há um sistema próprio de comunicação entre elas através de umas células chamadas lactobacilos, que são os habitantes mais importantes da nossa microbiota vaginal e que, quando têm condições para isso, trabalham para manter a saúde e equilíbrio do nosso pipi. De que forma?

Bloqueiam os recetores celulares para que não permitam a entrada de fungos (e o seu crescimento também).

Transformam a glicose em ácido lático, por isso é que o PH normal da vagina é ácido: para proteger a colonização de bactérias indesejáveis.

O que afeta o intestino, afeta também a vagina e a pele. O que afeta o intestino, afeta o sistema imunitário. A disbiose ou o desequilíbrio da microbiota pode acontecer por muitos fatores, mas os principais são: a toma de antibióticos (porque matam também as bactérias que nos protegem), os métodos contracetivos orais, a pílula, por causa dos estrogénios; o consumo excessivo de açúcar, alimentos processados e bebidas alcoólicas, o excesso de lavagem da vulva e da vagina, a utilização de produtos artificiais para a higiene íntima (se repararem na embalagem menciona que o produto tem Ph neutro, mas vimos que o Ph normal, fisiológico, não é neutro, é ácido), a falta de respiração/humidade decorrente do uso de pensinho diário nas cuecas e a composição da roupa interior que é fortemente sintética.

Assim, para manter uma boa saúde intestinal é crucial o papel da alimentação, do sono, é importante reduzir ao máximo os níveis de stress, praticar alguma atividade física que seja prazerosa, porque tanto o intestino quanto o cérebro são os responsáveis pela produção de algumas hormonas, uma delas a serotonina, que tem um impacto direto com o estado emocional, com o comportamento social, com a libido, com o desejo sexual… Consideramos que há um problema no intestino quando existe uma verdadeira patologia instalada (doença de chron, colon irritável, um cancro, diverticulite, diarreia, entre outros) todavia, as doenças têm um início e quando já estão instaladas há algo em comum entre elas – um desvio da normalidade, um sistema imunitário que não consegue mais gerir a presença de determinadas células e bactérias – uma disbiose.

Em sumula, quero dizer-te que: os tecidos genitais são pelo menos 3x mais sensíveis que qualquer outra mucosa e uma dica que te posso dar é “não coloques nada no teu pipi que não colocarias na boca”, não precisas de utilizar pensinho diário nas cuecas porque o muco vaginal é normal e dá-te informação sobre o teu ciclo menstrual e saúde geral: não é suposto as cuecas estarem limpas e imaculadas no final do dia, tal como quando as colocaste de manhã, e se colocas um penso, não tens oportunidade de observar o teu muco e crias, ainda, ambiente propício ao desenvolvimento de fungos. Usa roupa interior de algodão, de preferência de cores claras (versus tintura). Durante a menstruação, opta por opções de recolha e não de absorção do sangue, por exemplo, o copo menstrual. Quando fizeres xixi, limpa-te com papel higiénico (de preferência branco e sem perfume) e limpa-te sempre da frente para trás, para não arrastar os micróbios do ânus para a vagina. Atenção à depilação, os pêlos existem por algum motivo: desempenham uma função de proteção e regulação da temperatura. O pipi tem cheiro, é normal, não o deves camuflar com perfumes, limpar com toalhitas, nem com sabão xpto, porque todos os químicos e tóxicos que contêm esses produtos são absorvidos pela mucosa vaginal, modificando o Ph e a microbiota. Entram, depois, diretamente na corrente sanguínea, circulando por todo o corpo (são filtrados pelo fígado e encaminhados para o intestino), como se já não chegasse a nossa alimentação carregada de produtos agrotóxicos e todos os disruptores endócrinos que o nosso estilo de vida acarreta, assim como (algumas das) nossas emoções.

“Depois de um antibiótico, toma um probiótico”, alimenta-te de forma equilibrada, dá preferência aos alimentos de agricultura isenta de tóxicos, ingere entre a 1 a 2 litros de água por dia, prefere carne e peixe criados livremente, e “faz coisas” no dia-a-dia que te transmitam bem-estar.

Alguns destes comportamentos e produtos tóxicos acumulam-se nos tecidos pélvicos e órgãos sexuais. Muitas vezes, em consulta, quando sugerimos a modificação dos mesmos, as mulheres começam a relatar que o ciclo menstrual fica mais ajustado, sentem menos dor menstrual e mais bem-estar no geral, na verdade porque estão a desintoxicar-se! Necessitamos de saber este tipo de coisas, de ter informação do nosso lado para poder tomar decisões conscientes em prol da saúde e para poder cuidar o melhor possível de nós.