
Para a generalidade dos leitores pode parecer estranho associar-se Fisioterapia e obesidade, contudo são termos que se relacionam de forma importante.
Um dos pontos chave da ação do fisioterapeuta é a educação ao utente, onde se torna vital assegurar que se transmitem conhecimentos fundamentais para que este possa, de forma autónoma e eficaz, melhor gerir a sua saúde.
Informar adequadamente o utente sobre o impacto que determinadas escolhas em torno do seu estilo de vida acarretam no grau de saúde que possa (ou não) apresentar é função obrigatória de qualquer profissional de saúde. Muitos tópicos poderiam aqui ser escrutinados (p.e: qualidade do sono, tipo de exercício, mindset, etc), porém, o objetivo deste artigo é alertar para o impacto que uma alimentação equilibrada pode ter junto de patologias do foro músculo-esquelético e respiratório, que diariamente os utentes apresentam em consulta.
Do ponto de vista músculo-esquelético, a título de exemplo, podem destacar-se as patologias degenerativas, principalmente as que acometem os membros inferiores (p.e: artrose da anca, joelho e pé) e coluna lombar. É conhecida a relação entre o excesso de peso e um desgaste mais precoce das superfícies articulares, o que, porventura, pode ditar a presença de dor e deformidades articulares que, invariavelmente, resulta em perda de qualidade de vida. Apesar de existirem outros fatores a considerar nas patologias degenerativas (como os baixos índices de força e atrofia muscular), talvez até mais importantes que a sobrecarga mecânica ditada pelo excesso de peso, é lógico assinalar o impacto negativo que este desempenha.
O ponto anterior é talvez sobejamente conhecido por todos, contudo, há um outro aspeto, desconhecido para a generalidade da população, que apresenta um impacto gritante na saúde músculo-esquelética dos utentes. Existe evidência de que pessoas com uma percentagem mais elevada de adipócitos (células que armazenam gordura) – condição presente em sujeitos com sobrepeso e ainda em maior escala em utentes com obesidade – são indivíduos mais propensos a desenvolveram estados inflamatórios sistémicos de baixo grau. Isto significa que estas pessoas vivem permanentemente com um estado inflamatório generalizado, a que se associa o surgimento de queixas músculo-esqueléticas e à cronificação das mesmas, caso este estado (excesso de adipócitos) persista no tempo.
No que concerne às patologias do foro respiratório, importa referir que o número crescente de mortes relacionadas com o excesso de peso e a prevalência de obesidade junto da população mundial, se associa com a fisioterapia respiratória. Esta é tida como uma importante ferramenta que coadjuva na prevenção e tratamento das disfunções respiratórias advindas do excesso de peso.
A obesidade, na generalidade dos casos, está associada a uma ampla variedade de distúrbios respiratórios. Alterações na mecânica respiratória, na resistência ao fluxo aéreo, no padrão respiratório e nas trocas gasosas, são responsáveis pela perda de eficácia da função pulmonar. Por exemplo, em quadros de obesidade excessiva, observa-se redução da capacidade pulmonar total e da capacidade vital forçada, o que pode originar quadros de dispneia. Pessoas obesas apresentam frequências respiratórias mais altas em torno dos 25% a 40%.
A fisioterapia respiratória, tal como acima se aduziu, é parte integrante da abordagem à disfunção respiratória.
Referir ainda que o acúmulo de gordura na região torácica e abdominal induz redução na mobilidade da parede do tórax e do músculo diafragma (o mais importante músculo da inspiração). A produção científica afirma que, após a realização de fisioterapia, estes utentes veem incrementada a sua expansibilidade torácica e consequente função pulmonar.
Em suma, o que no inicio poderia parecer dissonante (relacionar fisioterapia com obesidade), é agora, espera-se, uma realidade “palpável”.
Notas finais:
- É obrigação de qualquer profissional de saúde, entenda-se para o propósito em questão – fisioterapeuta – educar os utentes sobre hábitos e estratégias diárias a implementar que potenciem a sua saúde.
- A ciência é unânime. Se não se ingere menos energia do que aquela que se gasta não se perderá peso, pelo que a intervenção da nutrição é fundamental. Vital é também o exercício físico, uma vez que é uma das formas de se gerarem maiores consumos energéticos. Contudo, sem intervenção nutricional, o exercício físico tem um efeito ligeiro na perda de peso. O processo de perda de peso não é fácil e carece de compromisso, porém o impacto brutal que apresenta na saúde dos utentes é realmente de considerar.
- O acesso a equipas clínicas multidisciplinares está na base do sucesso da intervenção em patologias músculo-esqueléticas e respiratórias.
Um abraço da sua equipa multidisciplinar
A FISIOGlobal
– Artigo de opinião escrito pelo Ft. Ricardo Amorim | Cédula profissional nº 629 –
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