As disfunções do complexo articular do ombro estão entre as patologias músculo-esqueléticas mais frequentes, principalmente numa sociedade envelhecida, no entanto, também afetam os indivíduos mais jovens.

O complexo articular do ombro tem a maior amplitude de movimento entre as articulações do corpo humano devido às menores restrições biomecânicas, mas esta particularidade tem como consequência um maior risco de formação de diferentes condições patológicas.

As diversas estruturas que constituem este complexo articular (nervos, músculos, ossos, cápsula articular, ligamentos, bursas…) executam a sua função de forma coordenada, garantindo a estabilidade necessária às exigências dos diferentes movimentos do membro superior. Neste artigo, abordaremos as bolsas sinoviais ou bursas, estruturas que por vezes são negligenciadas no diagnóstico e intervenção.

As bursas são estruturas semelhantes a “sacos” (cheias de líquido) que funcionam como “almofadas”, tendo como função lubrificar a articulação, reduzir o atrito/fricção e facilitar o movimento em zonas de contato tendão-tendão ou tendão-osso que experimentam alta sobrecarga mecânica, desempenhando também um papel importante na cicatrização dos tendões adjacentes.

Além disso, as bursas possuem receptores sensitivos e inervação própria, factor que, na presença de patologias do complexo articular do ombro, contribui para a ocorrência de sintomatologia dolorosa.

A patologia da bursa (bursite), pode ocorrer de forma isolada ou acompanhada de disfunção das estruturas adjacentes (músculo/tendão), sendo difícil perceber qual ocorre primeiro, dificultando o diagnóstico diferencial. Quando surge a inflamação na bursa, a mesma aumenta o seu volume, podendo comprimir o tendão/músculo e condicionar o seu normal funcionamento e, em casos mais graves, provocar a sua ruptura.

O quadro sintomático da bursite é semelhante ao de outras patologias do ombro e é caracterizado pela presença de dor na face ântero-lateral do ombro com possível irradiação para a cervical, braço e cotovelo, com limitação dos movimentos do ombro, crepitação e presença de edema. Esta sintomatologia tende a agravar-se com as atividades normais do dia-a-dia e pode aumentar a intensidade dos sintomas durante a noite.

Existem diferentes causas para o desenvolvimento de uma bursite, entre as quais destacamos:

  • Calcificações;
  • Infecção;
  • Doenças autoimune;
  • Aplicação inadequada de agente de vacinação;
  • Patologia nos músculos adjacentes;

Estas causas perturbam o equilíbrio natural do complexo articular do ombro, originando alterações de alinhamento das estruturas ósseas, diminuindo o espaço disponível e consequentemente aumentando a compressão e as forças de atrito, resultando em comprometimento funcional de estruturas como a coifa dos rotadores, a longa porção do tendão do bíceps e as bursas.

Deste modo, é fundamental uma correta identificação das estruturas envolvidas, recorrendo sempre que necessário aos meios complementares de diagnóstico (ex. ecografia, ressonância magnética nuclear- RMN). Existem diversas possibilidades de intervenção terapêutica, devendo as mesmas ser analisadas por uma equipe multidisciplinar.

Dentro da abordagem do fisioterapeuta, a combinação da terapia manual com o exercício demonstrou ser eficaz na redução da sintomatologia dolorosa e melhoria da mobilidade. Estes resultados podem ser potencializados por procedimentos minimamente invasivos como a Electrólise Percutânea Intratecidular (EPI®) e a infiltração local ecoguiada.

Nos casos mais graves e com sintomatologia recorrente em que não são obtidos resultados satisfatórios com o tratamento conservador, surge a opção da cirurgia. Relativamente ao tratamento cirúrgico, existe alguma controvérsia no que concerne à melhor opção. Existe evidência que defende a remoção da bursa (procedimento designado por bursectomia), na presença de inflamação, sintomatologia dolorosa e limitação funcional, no entanto, outros defendem a potencial ação regenerativa desta estrutura no tendão e estruturas adjacentes salvaguardando as consequências negativas da ausência da mesma na mobilidade do ombro. Por estes motivos, a importância desta estrutura não deve ser descuidada, sendo que sua remoção cirúrgica deve ser realizada com critério para obter o melhor outcome possível.

– Artigo escrito pelo Fisioterapeuta Tiago Soutelo.

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